Segunda parte da entrevista, a publicação original pode ser vista aqui.
É no projecto lusófono chinês que o território deve ter uma palavra dizer, defende o presidente do Observatório da China. Rui D’Ávila Lourido é também da opinião que Portugal ocupa a posição geoestratégica ideal para servir de plataforma comercial entre a China e o restante mundo de língua portuguesa.
Pedro Galinha
- Em que patamar estão as relações Portugal-China?
Rui D’Ávila Lourido – Assiste-se a uma intensificação das relações, consubstanciada igualmente pelo significativo número de portugueses que têm procurado várias cidades chinesas para trabalharem e fixarem os seus negócios, em especial Macau, Pequim e Xangai. Vários acordos foram assinados nas áreas da saúde, protecção recíproca de investimentos, ensino das línguas portuguesa e chinesas, moldagem, comunicações e tecnologias.
- Ainda há mais espaço para Portugal alargar os pontos de contacto?
R.A.L. – Deveremos aprofundar a reflexão e dar uma especial atenção à estratégia lusófona da China. Na sequência dos princípios orientadores da sua política interna de desenvolvimento harmonioso da sociedade chinesa e de respeito pelo meio ambiente, a China gizou uma estratégia que pretende assegurar um contínuo desenvolvimento económico. Com esta estratégia procura diminuir a pobreza, garantir o alargamento da prosperidade a sectores cada vez mais vastos da população chinesa e canalizar meios, nomeadamente, para a recuperação de água potável e do ar poluído em muitas áreas urbanas e rurais da China. Tendo subjacente os princípios gerais da diplomacia chinesa, não podemos esquecer a preocupação da China, à semelhança do que acontece com os países ocidentais, em colmatar as necessidades de matérias-primas e de fontes de energia. A China estabeleceu relações nos cinco continentes com os países produtores de matérias-primas, como hidrocarbonetos (petróleo de Angola, Brasil e Timor) ou gás natural (Moçambique) ou alimentares (do Brasil a soja) e tecnologias alternativas (como as eólicas em Portugal).
- É nesta dimensão que congrega os países lusófonos que Macau pode ter um papel importante para a China?
R.A.L. – A China compreendeu a mais-valia que representa a cidade de Macau, com as suas raízes e ligações histórico-culturais e económicas, pelo que a transformou na sua plataforma oficial, facilitadora de contactos com os países lusófonos. O Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa [Fórum Macau] constituído pelo Governo Central chinês é disso exemplo.
- Enquanto investigador e observador da realidade chinesa, quais são as grandes vantagens de Macau?
R.A.L. – Macau apresenta várias vantagens, nomeadamente, o seu sistema legal que, sendo semelhante ao português, facilita as relações económicas. Para prevenir uma taxação dupla, foram criados acordos de Macau com Portugal e Moçambique, tendo como objectivo estendê-los a todos os países de língua portuguesa. O Governo da RAEM tem tido uma grande sensibilidade na preservação do património histórico construído de raiz portuguesa, que culminou na obtenção da classificação, pela UNESCO, de Património Histórico da Humanidade. Em Macau tem sido incentivado o intercâmbio com as culturas e a língua portuguesa, nomeadamente, através do apoio à formação de formadores para o ensino da língua na China, no apoio à organização de encontros, de colóquios e de conferências internacionais e no incentivo à difusão da obra de escritores sobre Macau. Foi também em Macau que se realizou, em 2006, a primeira edição do evento multidesportivo “Jogos da Lusofonia”.
- Mas a nível da relação económica entre os países lusófonos e a China, Macau também tem hipótese de se assumir como um elemento-chave?
R.A.L. – Naturalmente que a maior parte dos negócios entre os países lusófonos e a China se têm realizado bilateralmente, mas o Fórum Macau tem aumentado as suas oportunidades. A Associação Comercial Internacional para os Mercados Lusófonos, de Macau, tem desenvolvido igualmente um diversificado número de negócios, como a exportação de medicamentos chineses para Cabo Verde, Moçambique e também Angola – onde chegam ainda vestuário, calçado e motorizadas. Por outro lado, importa madeira, algodão e caju de Moçambique, café de Timor-Leste e azeite, vinho e medicamentos de Portugal.
- No caso específico de Portugal, ainda há espaço para alargar a relação/parceria comercial e económica com Macau?
R.A.L. – Portugal e Macau podem e devem reforçar o seu papel como plataformas facilitadoras de relações culturais e de negócios entre a China e os países lusófonos. O alargamento do Canal do Panamá permitirá, em 2014, o acesso mais rápido e directo da China a Portugal. O porto oceânico de Sines será o primeiro no continente europeu que um navio vindo da Ásia, dos Estados Unidos ou do Brasil encontrará. Esta posição geoestratégica será uma grande vantagem económica e um grande desafio a ser assumido por Portugal.
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